O “Lixo” é como ficou conhecida a comunidade José Benedito da
Silveira, na entrada de Itabaiana, Paraíba. É um conjunto marcado pela pobreza
e falta de estrutura urbana. O prefeito Antonio Carlos mandou fazer arremedo de
calçamento que se desfez nas primeiras chuvas. Os jovens da localidade sonham
com uma pracinha onde possam ter o mínimo de lazer, com sinal de internet. “A
gente precisa descer pra rua grande, Praça Epitácio Pessoa, onde tem wi-fi”,
reclamou Evandro Vicente Ferreira (foto), 21 anos, estudante da Escola Santiago,
próxima ao conjunto.
Evandro é filho de mecânico e tem um sonho: gravar CD com
suas músicas. Desempregado, ele não tem perspectiva de ocupação remunerada na
cidade. É adepto do Hip Hop e tem quinze músicas prontas. “Meus amigos me acham
um ótimo MC, mas eu tou pensando em desistir desse sonho porque aqui não temos
oportunidade para pessoas com talento”, lastima.
Perguntado se sabia das ocupações que estão sendo feitas por
estudantes do Brasil em protesto contra as medidas do Governo para diminuir os
investimentos na educação, Evandro afirmou que não sabia do fato. “Tou sabendo
agora disso, meus professores não falam e não ouvi no rádio. Na TV, vi alguma
coisa desse tipo, mas não prestei atenção”, disse ele.
Fã do grupo Hungria Hip Hop de Brasília, Evandro também
reclama das rádios que não tocam seu gênero favorito. “Só escuto a Rádio
Itabaiana e a 98 FM, porque a Rádio Comunitária Rainha não chega o sinal em
minha comunidade”, explicou. Indagado se já leu um livro algum dia, ele diz que
faz tempo e não lembra. E do que fala sua música? “Romantismo, coisas do amor”,
explica. Ao ser esclarecido de que o Hip Hop é ‘filho’ da rebeldia, falando da
situação dos moradores das zonas periféricas, da opressão e massacre dos jovens
negros, Evaldro foi cético: “Mas, será que adianta falar dessas coisas? Poucos
escutam, ninguém liga pra nós”.
Eleitor do líder comunitário Sousa de Campo Grande, o rapper
declara seu voto e lastima porque seu candidato não ganhou. “Ele conquistou
nosso voto pelas propostas, por ter conversado principalmente com os jovens da
comunidade”, esclareceu. O que espera do novo prefeito eleito? Evandro ficou um
instante em silêncio e fez sinal de descrença. Ele é de uma geração que passou
por várias gestões municipais desprovidas de qualquer tipo de compromisso sério
com as comunidades.
Ao final, faz questão de dizer que seu melhor professor é o
de Geografia, por nome Oséas. “Ele sabe ser professor e amigo”, afirmou. O
único parceiro de Hip Hop na cidade é Gabriel Feitosa, também estudante no
Colégio Dom Bosco. “Nunca fizemos música juntos, mas admiro o trabalho dele”,
revelou Evandro. E aproveitou para mandar um recado ao prefeito Lúcio Flávio,
que assume em janeiro: “faça a nossa pracinha no ‘Lixo’”.
Na entrevista, a reportagem lembrou que o Papa Francisco,
durante seu primeiro encontro com os participantes da Jornada Mundial da
Juventude, na Cracóvia (Polônia), pediu aos jovens que "se rebelem,
questionem, sonhem, e evitem os caminhos obscuros". Evandro fez questão de
esclarecer: “não uso drogas, não quero dar esse desgosto à minha mãe.”
Foi bom ser entrevistado. Tive a chance de falar como é a realidade nas comunidades e em cidades.
ResponderExcluirObrigado
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